domingo, 13 de março de 2011

A caixa (história - parte 3)



Cheguei em casa por volta das quatro horas da manhã. A perícia me encheu de perguntas sem lógica, como: "O senhor foi quem recebeu a ligação?", "Há que horas você chegou aqui?", "Você conhecia a família?", "Havia alguém na casa?" e tantas outras que não chegariam ao assassino. Somente a mim e àquele momento. Não mostrei aos meus companheiros os arquivos que havia conseguido, pois eu sabia que se eles o tivessem em mãos não permitiram minha participação no caso.

Como já disse eu era o responsável por atender ligações e fazer o passeio turístico. Eu servia de piada para os outros policiais. Afinal de contas só porque eu era o antigo empresário milionário isto não significava que eu iria ficar na área mais prestigiada da polícia. Pelo contrário, meus superiores estavam mais preocupados com a minha segurança. E com certeza o meu trabalho não oferecia risco algum.

Deixei os arquivos sobre a cama. Deste a morte de Karen passei a viver na sua casa. Acreditava que eu morando lá poderia passar o tempo que não passei com ela. Tomei o banho mais frio que pude na tentativa de apagar as memórias que tinha visto. Era apenas uma tentativa. Coloquei a bermuda do pijama e sentei-me sobre a cama. 

Olhei os arquivos e não via nada de interessante. Apenas papéis sobre ONG's, serviços de apoio a hospitais, asilos e creches. Mas três me chamaram a atenção. O primeiro era sobre a minha empresa. Claro que eu trabalhando na polícia não deixei de ter informações sobre ela. Mas nada que me ocupasse mais que meu trabalho atual. Afinal, eu era o dono de um império de dinheiro. Este papel em questão falava sobre uma nova pesquisa com células troncos embrionárias que avançava de forma estrondosa, todavia precisava de apoio do governo.

O segundo era um pedaço de jornal. Contado o caso de uma menina em coma que ficou grávida. A polícia nunca encontrou o estuprador. Mas segundo informações a desconfiança estava sobre um dos enfermeiros. 

O último pedaço de papel foi o que me assustou. Era uma carta de Karen para Mirela, sua amiga recém assassinada.

"Temos que contar ao meu irmão o que descobrimos. Mirela, isto é muito maior do que imaginamos. Eu tenho certeza que ele não sabe o que a empresa dele esta fazendo. Ele pode ser um tanto contraditório a mim, mas ele jamais feriria a ética desta forma.

Vou me encontrar com o enfermeiro que está sendo acusado. Eu tenho certeza de que não é ele o culpado.

Obs.: Melhor pararmos de nós falarmos. Acho que estamos sendo vigiadas."

Deixei a carta deslizar sobre meus dedos e cair sobre o chão de madeira. Minha irmã sabia algo a respeito da minha empresa e a todo momento queria me dizer. Lembrei-me então da semana da sua morte. No meu celular havia dez chamadas não atendidas dela. A minha secretária disse que ela queria falar comigo e todas as vezes eu lhe pedia para dizer que eu estava em reunião ou que havia saido.

Um dia antes da sua morte ela apareceu em frente à Genisis para falar comigo. Estava sem fôlego. E eu andava a caminho do meu carro. Disse que tinha que me dizer algo urgente, mas que deveria ser em particular. Sem ninguém da empresa, nenhum segurança, nenhum empresário por perto. E eu apenas respondi.

- Você já é adulta o bastante para lhe dar com seus problemas.

E fechei a porta.

Levantei-me da cama em um salto e peguei o celular que Henrique havia me ligado. Haviam ligações para médicos, marido, escola e várias para Paulo César. Nome do enfermeiro que li no pedaço de jornal. Liguei para ele e uma voz sonolenta atendeu. Disse para ele não desligar, informei quem era e do que se tratava. Paulo César ficou agitado com a notícia e me disse que caso eu quisesse conversar com ele que aparecesse em sua casa daqui duas horas, pois ele fugiria. 

Como combinado apareci no local de encontro que aliás me surpreendeu muito. Claro que médicos, cirurgiões, empresários e pastores ganham fortunas; mas não esperava isto de um enfermeiro. Sua casa tinha dois andares, piscina, era bem localizada e planejada. Paulo César terminava de colocar as malas no carro quando me aproximei. E antes de me apresentar ele se adiantou:

- Eu sei quem o senhor é. Não precisamos perder tempo nos apresentando. Não teremos tempo de conversar. Por isso tudo que sei está aqui dentro. - me entregou uma pequena caixa de madeira.

Fechou o porta-mala e dirigiu-se para a porta do motorista.

- O senhor tem saber que agora corre perigo. - disse ele olhando-me nos olhos. - Sempre achei que o senhor soubesse. Afinal era a sua empresa. - ele agora olhava para o sol. - Fiquei surpreso quando sua irmã veio me procurar a seis anos atrás. E pensei que esta história tinha acabado. - Ele abriu a porta do carro. - Mas a cinco dias a amiga maluca dela apareceu aqui em casa junto com o filho. Coitado...

Fechou a porta do carro e ligou o motor. Deu ré e endireitou o carro na pista. Abriu a janela e disse:
- Não digo que não tenho culpa. Era apenas uma questão de aproveitar a oportunidade dada. - fechou a janela e partiu.

Fiquei calado o tempo inteiro e em nenhum momento o impedi. Eu observava  o carro deslizar sobre a pista em direção ao nascer do sol. Parecia uma fuga digna, antes que o carro explodisse a duzentos metros de sua partida.

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