domingo, 14 de novembro de 2010

Uma história...



Ela tinha acabado de acordar com o barulho da ambulância do lado de fora. "Mais um acidente" pensou. Continuou deitada pretendendo pegar no sono outra vez. Até que sentiu seu corpo molhado. Não sabia por quê motivo sua roupa estava tão grudenta , afinal não se lembrava de nada da noite passada. Estava cansada demais para se levantar. Todavia, se esforçou para ligar o interruptor que estava ao seu lado. A luz que não deveria vir.
Ela vestia uma calça de pijama junto com a blusa de seda que ela usou na noite passada e não teve tempo de tirar. Mas a seda estava com uma cor diferente. Não era o mesmo verde que realçava a cor de seus olhos. Era mais negro, mais obscuro. Era mais violento. A seda estava ocupada com sangue, muito sangue. Não era dela, ela sabia disso. E era isso que a assustava.
Olhou em volta em busca de resposta. O quarto estava como sempre o deixou: bagunçado. A porta do armário aberta mostrando a sua desorganização, a roupa de cama estava esparramada pelo chão junto com suas roupas intimas a qual ela escolhera com tanta dedicação esperando algo na noite anterior. O único lugar organizado deste cômodo era a cama de sua irmã que ela não ousava deixar nada em cima desde que a mesma foi dada como morta há cinco anos.
Não poderia gritar com receio de acordar os pais. Tinha 26 anos e não criara coragem suficiente para abandonar a segurança deles. Ou talvez, seus planos tenham mudado de rumo desde daquele incidente com a sua irmã. Levantou-se, pegou a roupa de cama para tampar sua vestimenta ensanguentada. Certidicou-se de que o corredor estava vazio e imediantamente entrou no banheiro.
Durante o banho limpava a blusa e pensava cuidadosamante na noite anterior. Seu amigo veio lhe buscar em casa, ela estava se maquiando enquanto ele conversava com seu pai. Sr. Nicolau confiava somente neste amigo. Ela vestiu aquela blusa de seda e olhou-se no espelho. "Desculpe por usar sua blusa, Sofia" pensou e uma lágrima escorreu de seus olhos. Ela sempre se desculpava com a irmã falecida por usar suas roupas. Saiu, despediu-se de seu pai e de sua mãe, que quando a viu começou a chorar. Fez as mesmas falsas promessas que fazia aos pais. "Não se preocupem. Não irei beber"; "estarei em casa cedo" e; "podem dormir tranquilos". Nenhum pai dorme tranquilo depois de perder um filho. Entrou no carro de Pietro e pegaram a avenida principal. Ela começou a festa cedo. Já estava em seu segundo copo de vodka puro dentro do carro. Pietro insitia para que ela parasse e que continuasse somente na festa. Mas a suas palavras de amigo não serviam mais. A festa era de um conhecido dela da antiga faculdade que ela havia abandonado depois de tudo. Depois...
Não se lembrava. Ela não se lembrava o que aconteceu durante a festa e depois dela. Não se lembrava de como havia chegado em casa e como aquele sangue havia parado em sua blusa. Ouviu uma batida na porta:
- Filha. É você? - perguntou Sr. Nicolau.
- Sim. - respondeu sem dar nenhum sinal do desespero que sentia.
Terminou o banho. Vestiu uma calça jeans e uma blusa cavada branca e calçou uma rasterinha. Saiu do banheiro e foi direto para a cozinha realizar sua rotina para que os pais não desconfiassem. Tomou um café com leite e comeu pão com ovo. Sua mãe a olhava desconfiada.
- Você chegou que horas ontem? - Dona Yasmin perguntou.
- Não sei. Não me lembro. - e continuou a comer.
- Pois eu me lembro. - disse sua mãe. - Você chegou exatamente há duas horas. Será que você não toma juízo "dona" Samantha? Já não basta a gente ter perdido a sua irmã. - começou a chorar. - Você quer aumentar ainda mais o nosso sofrimento?
- Mãe! Eu cheguei em casa, não cheguei? Estou aqui, não estou? - pegou a mão da mãe e tocou sobre seu corpo. - Então para com este trama. E...
- Respeite sua mãe Samantha. Você está fora dos limites. - seu pai entrou na conversa. - Todo final de semana é a mesma história de sempre. Você chega em casa bêbada de madrugada e não lembra de nada. Até quando vai durar essa sua irresponsabilidade?
- Até quando vocês aceitarem que eu não sou a Sofia. - ela respondeu sem pensar e saiu da cozinha já pegando a chave do carro.
Não queria ouvir sua mãe chorando. Não aguentava vê-la chorando. Já fazia cinco anos que a irmã havida sido dada como morta mesmo que nunca houvessem achado o corpo dela. E a mãe ainda tinha esperança de encontrá-la. Se Sofia estivesse viva alguem ligaria pedindo resgate ou então ela apareceria. "Sofia daria alguma notícia" era a única justificativa que fazia Samantha aceitar sua morte. Já estava na rua e nem notara. Decidira, no meio do caminho sem direção, ir para a casa de Pietro em busca de informações da noite passada.
Tocou o interfone sem parar até que finalmente ele atendeu com a voz sonolenta.
- Pietro. Sou eu, Samantha. Deixe-me entrar.
Ele abriu a guarita do prédio Residencial Solar e esperava Samantha na porta de seu apartamente 212A. Com sua cueca samba canção azul e escorado na porta ele parecia um típico vagabundo de faculdade e ninguém imaginaria que aquele era um dos grandes promotores da cidade. Pietro tinha 28 anos. Conhecera Samantha na faculdade. Era alto, moreno claro, cabelo bagunçado e olhos castanhos escuros. Muitas mulheres dariam tudo para ser Samantha naquela hora.
- Da próxima vez vista alguma coisa.
- Você sempre me viu sem blusa.
- Mas não com cueca
- Você quer que eu tire. - ele brincou.
Finalmente percebeu que Samantha estava séria demais e vestiu uma calça jeans clara e uma blusa vermelha. Só vira Samantha tão séria uma única vez quando ela recebeu a notícia de que Sofia havia desaparecido. Depois disso os humores da amiga variavam de muito triste para um pouco menos triste.
- O que houve? - perguntou Pietro.
- O que aconteceu ontem na festa?
- É essa a pergunta? Samantha você me acorda uma hora dessa pra fazer a pergunta que você me faz sempre?
Aquela não era realmente a pergunta que ela queria fazer e ambos notaram isso. Mas Pietro ainda sim respondeu:
- Você bebeu todas e depois desapareceu com um homem.
O final assustara Samantha, mas ela tinha que continuar a conversa.
- Que homem?
Alguém bateu na porta. Só que não foi somente uma batida. Foram batidas desesperadoras seguidas de gritos chamando por Pietro. Era sua vizinha com quem ele tinha sucessivos casos. Ela tinha ciúmes de Samantha, mas a ida dela ali, com certeza, não era por ciúmes.
- Você... - ela notou que a melhor amiga dele estava lá. - Vocês viram o noticiário da televisão.
Ligaram a TV para saber do que se tratava. A notícia que Samantha também não deveria escutar.

"Foi encontrado hoje no quatro do Motel Sete Pecados o corpo do Secretário de Justiça do Estado, Sr. Ernesto Graão. Ele foi encontrado com sete facadas em pontos estratégicos do corpo. Segundo afirma o delegado responsável pela cena do crime o assassino com certeza sabia onde realizar os golpes de forma que a vítima sofresse lentamente e perdesse o sangue aos poucos.
Sr. Ernesto Graão estava em um evento da alta sociedade jurídica a fim de comemorar a adesão do país à pena de morte e também a diminuição da maioridade penal. Segundo afirmam familiares da vítima ele não tinha nenhum inimigo se não parte da população que era contra essa adesão.
A viúva de Ernesto Graão não tem nada a declarar quanto ao corpo do marido ter sido encontado em um motel..."

Pietro desligou a televisão e se juntou a sua vizinha e a amiga no sofá que, como ele, estavam pasmas com o acontecido.
- Vocês estavam nesse evento. Não viram nada de estranho? - pergunto Grazi, a vizinha.
- Não. Não vimos. - respondeu Samantha.
- Será que você poderia nos dar licença. - falou Pietro se referindo a sua vizinha. - Eu e Samantha precisamaos resolver alguns assuntos quanto ao acontecido. Precisamos fazer algumas ligações e visitas.
Grazi saiu do apartamento e instataneamente Pietro correu para seu quarto e pegou uma mala. Tirou o quadro de Picasso que tinha em seu escritório onde atrás se encontrava um cofre. Samantha não entendia o que o amigo estava fazendo. Será que ele era o assassino?
- Pietro da pra me explicar o que você esta fazendo?
Então ele percebeu que Samantha não sabia de nada. Ela realmente não se lembrava de nada. Ela não sabia que o homem com quem ela saiu naquela noite era o Secretário de Justiça do Estado.
- Você não se lembra?
- Lembro do que?
- O Sr. Ernesto Graão é o homem com quem você saiu noite passada. Eu lhe disse para você não ir com ele. Mas você não me escutou. Não ligava que ele era casado. Eu te disse mil vezes que ele não era companhia para você. - e falava sem perceber a expressão de Samantha. - Mas você mudou muito desde de que sua irmã faleceu. Você nem me escuta mais...
"Você isso", "você aquilo". Samantha não consegui escutar nada. Eram apenas frases sem final. Na qual ela sabia que era a protagonista. Ela era o sujeito da ação e da reação. Ela via Pietro gesticulando seus lábios em um som mudo e sua mente procurava criar significado para tudo aquilo. "É mentira," ela pensava. "Eu não matei ninguém", ela insitia. Lembrar era o que ela mais desejava. Agora só via pequenos flash. A dança, o uísque, a cantada, a pegada, a saída, o motel. E depois? O que aconteceu depois? Ela passou a noite junto com aquele estranho? Ou ele não era mais um estranho para ela?
- Samantha! - Pietro sacudiu seu braço. - tome esse dinheiro. - ele lhe entregou a mala. - Você vai precisar dele mais do que eu. E...
- Não! - falou a amiga jogando a mala no chão. -Eu não vou fugir. Não podem me culpar por algo que eu não fiz. - ou que pelo menos ela achava que não havia feito.
- Você não entende Samantha. A lei de pena de morte foi aprovada e você foi a última pessoa que estava com ele quando morreu. Você é a única testemunha e também a única suspeita. O Sr. Ernesto Graão é um homem importante e com certeza a justiça irá procurar a primeira pessoa qua aparecer. Pegue logo isso e suma por algum tempo. - disse lhe devolvendo a mala. - Mude seu número, sua identidade. Que sabe mude até de país.
- Pietro você está exagerando.
- Não! - disse ele quase chorando. - Eu não estou exagerando. Quando a lei foi aprovada e eu ajudei a aprova-la eles afirmavam que já iriam matar os presos que estavam sendo julgados por asassinato até mesmo os menores de idade. A mídia não sabe disso, pois eles só iriam anunciar depois de algum tempo. Por favor Samantha. Saia. Saia daqui enquanto é tempo.
Samantha saiu da casa de Pietro com R$500.000,00 na mala. Não sabia para onde ir. Conseguiria facilmente mudar sua identidade, pois poderia pegar o nome de sua irmã falecida. Daria tempo de ir em casa e pegar algumas poucas roupas e desperdice dos pais. Poderia inventar uma mentira qualquer como sempre fazia, só que desta vez haveria de ser para sempre.


- Aonde você vai? - perguntou seu pai.
- O senhor sempre me disse para eu tomar jeito na vida. É o que estou fazendo. Estou indo embora de casa para deixá-los em paz.  - disse Samantha controlando as lágrimas para que elas não caissem sobre o rosto. - Desde que Sofia morreu vocês vivem me perseguindo, perguntando onde eu vou, onde estou, o que vou fazer. Não confiam mais em mim. Sermpre desconfiando de tudo. - O que ela iria dizer agora doeria para dos dois lados. - Sabe o que eu acho? - "melhor eu dizer para não vê-los sofrerem por mim". - Que vocês prefeririam a minha morte do que a de Sofia.
Pronto. O que ela não tinha que dizer, ela disse. Agora deveria pegar alguma estrada qualquer e seguir. Pois essa história apenas começou.

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